
Ponho a mão no puxador. Hesito. Olho pelo óculo. Hesito. O som estridente da campainha regressa. Rodo a chave e abro a porta, muito devagar.
Oi - cumprimenta-me a brasileira, toda promessas, chupando languidamente um chupa ("Um chupa misto?" Podia perguntar mas não o faço).
Olá - respondo, tão entusiasmado como se estivesse num velório.
Posso? - pergunta ela, constatando a minha falta de movimento para a deixar passar. Não sei porquê olha-me para as mãos, vazias.
Ó Daniela... - balbucio-lhe o nome em tom pesaroso. Olho-a sem expressão (mas cheio de estilo, claro) e informo-a, lacónico, ainda que com um ligeiro sotaque brasileiro que não consigo evitar: - Hoje não dá.
Mas... - Ela olha-me desolada. - Mas... - repete, rodando languidamente o chupa sobre a língua. - Tem a certeza? - pergunta num sussurro provocante com um sotaque de veludo, terminando com os lábios envolvendo o chupa que empurra e puxa devagar.
Engulo em seco e respiro fundo para ganhar coragem: - Hoje é o período de reflexão - explico, apontando para os alvos dos dardos com as trombas dos candidatos. - Desculpa, Daniela, mas tenho de continuar a reflectir - e fecho a porta, suave mas resolutamente ante o olhar magoado e o beicinho triste da brasileira.
TEXTO DA AUTORIA DE GARFANHO
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